sexta-feira, 4 de março de 2016

Lei natural: O superior e o inferior




Os homens erram pelo Jardim da Natureza, convencidos de quase tudo conhecer e
saber, e, no entanto, com raras exceções, deixam de enxergar um dos princípios básicos de maior
importância na sua organização a saber: o isolamento de todos os seres vivos desta terra dentro
das suas espécies.
Já a observação mais superficial nos mostra, como lei mais ou menos implacável e fundamental,
presidindo a todas as inúmeras manifestações expressivas da vontade de viver na Natureza, o
processo em si mesmo limitado, pelo qual esta se continua e se multiplica. Cada animal só se
associa a um companheiro da mesma espécie. O abelheiro cai com o abelheiro, o tentilhão com o
tentilhão, a cegonha com a cegonha, o rato campestre com o rato campestre, o rato caseiro com o
rato caseiro, o lobo com a loba etc.
Só circunstâncias extraordinárias conseguem alterar essa ordem, entre as quais figura, em
primeiro lugar a coerção exercida por prisão do animal ou qualquer outra impossibilidade de união
dentro da mesma espécie. Ai, porém, a Natureza começa a defender-se por todos os meios, e seu
protesto mais evidente consiste, ou em privar futuramente os bastardos da capacidade de
procriação ou em limitar a fecundidade dos descendentes futuros. Na maior parte dos casos, ela
priva-os da faculdade de resistência contra moléstias ou ataques hostis. Isso é um fenômeno
perfeitamente natural: todo cruzamento entre dois seres de situação um pouco desigual na escala
biológica dá, como produto, um intermediário entre os dois pontos ocupados pelos pais. Significa
isto que o filho chegará provavelmente a uma situação mais alta do que a de um de seus pais, o
inferior, mas não atingirá entretanto à altura dos superiores.. Mais tarde será, por conseguinte,
derrotado na luta com os superiores. Semelhante união está porém em franco desacordo com a
vontade da Natureza, que, de um modo gera], visa o aperfeiçoamento da vida na procriação. Essa
hipótese não se apoia na ligação de elementos superiores com inferiores mas na vitória
incondicional dos primeiros. O papel do mais forte é dominar. Não se deve misturar com o mais
fraco, sacrificando assim a grandeza própria. Somente um débil de nascença poderá ver nisso uma
crueldade, o que se explica pela sua compleição fraca e limitada. Certo é que, se tal lei não
prevalecesse, seria escusado cogitar de todo e qualquer aperfeiçoamento no desenvolvimento dos
seres vivos em gera.
Esse instinto que vigora em toda a Natureza, essa tendência à purificação racial, tem por
conseqüência não só levantar uma barreira poderosa entre os superiores, inferiores e o mundo exterior, como
também uniformizar as disposições naturais. A raposa é sempre raposa, o ganso, ganso, o tigre,
tigre etc. A diferença só poderá residir na medida variável de força, robustez, agilidade, resistência
etc., verificada em cada um individualmente. Nunca se achará, porém, uma raposa manifestando a
um ganso sentimentos humanitários da mesma maneira que não há um gato com inclinação
favorável a um rato.
Eis porque a luta recíproca surge aqui, motivada, menos por antipatia íntima, por exemplo, do
que por impulsos de fome e amor. Em ambos os casos, a Natureza é espectadora, plácida, e
satisfeita. A luta pelo pão quotidiano deixa sucumbir tudo que é fraco, doente e menos resoluto,
enquanto a luta do macho pela fêmea só ao mais sadio confere o direito ou pelo menos a
possibilidade de procriar. Sempre, porém, aparece a luta como um meio de estimular a saúde e a
força de resistência na espécie, e, por isso mesmo, um incentivo ao seu aperfeiçoamento.
Se o processo fosse outro, cessaria todo progresso na continuação e na elevação da espécie,
sobrevindo mais facilmente o contrário. Dado o fato de que o elemento de menor valor sobrepuja
sempre o melhor na quantidade, mesmo que ambos possuam igual capacidade de conservar e
reproduzir a vida, o elemento pior muito ,mais depressa se multiplicaria, ao ponto de forçar o melhor
a passar para um plano secundário. Impõe-se, por conseguinte, uma correção em favor do melhor.
Mas a Natureza disso se encarrega, sujeitando o mais fraco a condições de vida difíceis, que, só
por isso, o número desses elementos se torna reduzido. Não consentindo que os demais se
entreguem, sem seleção prévia, a reprodução, ela procede aqui a uma nova e imparcial escolha,
baseada no princípio da força e da saúde.
Se, por um lado, ela pouco deseja a associação individual dos mais fracos com os mais fortes,
ainda menos a fusão dos superiores com os inferiores. Isso se traduziria em um golpe quase
mortal dirigido contra todo o seu trabalho ulterior de aperfeiçoamento, executado talvez através de
centenas de milênios.


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