segunda-feira, 5 de junho de 2017

Brasileiro continua preso suspeito de integrar o Estado Islâmico


Isac começou a frequentar o templo há quatro anos
Sem uma condenação, Isac Pinheiro dos Santos, morador do Entorno do Distrito Federal, está preso há quase um ano, incomunicável. Passou nove meses na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS), a 1.100km da família. E só falou com um parente duas vezes, por meio de videoconferência. A mãe nem sequer sabe onde ele está. O rapaz de 29 anos depende dos serviços de um defensor público, que nunca esteve com ele pessoalmente. O caso tramita sob segredo de Justiça. Mas por que tanto mistério?

Preso há 11 meses, Isac Pinheiro dos Santos só falou a com mãe, duas vezes, por meio de videoconferência

Isac é acusado de integrar um grupo de brasileiros que organizava uma célula terrorista e planejava um atentado nos Jogos Olímpicos de 2016. Policiais federais rastrearam redes sociais, sites acessados e mensagens trocadas entre os suspeitos pelo aplicativo Telegram, e verificaram intensa comunicação, conclamando interessados a prestar apoio ao Estado Islâmico (EI), com treinamento no Brasil. A investigação resultou na Operação Hashtag, deflagrada em  julho de 2016.

Federais prenderam 15 pessoas em nove estados e as encaminharam a Campo Grande. Alguns noticiaram a realização do “batismo” ao Estado Islâmico, conhecido como bayat — juramento de fidelidade exigido pela organização terrorista a novos integrantes. Agentes também identificaram mensagens de celular (inclusive com diálogos sobre como fabricar bombas caseiras) relacionadas à possibilidade de um ato terrorista na Rio-2016.

Dois acusados deixaram o presídio, em 17 de setembro, usando tornozeleiras eletrônicas. No entanto, há três semanas, o juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara Federal de Curitiba, condenou oito. Isac ficou de fora da sentença, mas teve a prisão prorrogada por mais 30 dias. O magistrado enviou o caso à Justiça Federal em Brasília, que o remeteu a Anápolis (GO), comarca à qual está subordinada Águas Lindas (GO), cidade do Entorno onde Isac morava com a mãe.
Rejeição do pai

Isac nasceu em Parnaíba (PI), em 1988. Ainda no primeiro ano de vida, a mãe, Maria de Jesus Machado Normanda, mudou-se para o DF. Assim que arrumou trabalho como diarista, buscou o menino. Pai, mãe e filho moraram juntos por dois anos. Com a separação, Maria decidiu voltar à terra natal. O pai continuou em Brasília, onde começou a trabalhar como cinegrafista em uma emissora de tevê. Casou-se de novo, teve mais dois filhos e nunca mais, segundo os parentes, quis ter contato com Isac.

Desempregada, Maria retornou à capital federal com Isac, quando ele tinha 10 anos. Os dois se estabeleceram em Ceilândia, onde moravam parentes. Entre eles, Ananias Pinheiro, tio paterno de Isac. “Sempre comprei o que ele precisava e ele me procurava para ouvir conselhos. Convivia com os meus filhos, era estudioso. Mudou o comportamento quando foi para Águas Lindas. Lá, ele se juntou a más companhias”, conta Ananias. Vivendo de diárias, Maria trocou o DF pelo Entorno em busca de um aluguel mais barato.

Mãe e filho ainda voltaram a Ceilândia, mas, também por causa do valor do aluguel, fixaram-se em Águas Lindas. Isac passou a consumir maconha e cocaína. Com 18 anos recém-completados, após discutir em um jogo de futebol, deixou a quadra e voltou com um revólver. Atirou no desafeto, filho de um policial militar, que sobreviveu. Poucos minutos depois, PMs prenderam Isac na porta do colégio, em Ceilândia. Ele tentou esconder a arma na mochila de uma adolescente. Acabou condenado por tentativa de homicídio, porte ilegal de arma e corrupção de menor.

Da Papuda à religião

Nos dois anos no Complexo Penitenciário da Papuda, Isac decorou a Bíblia. Mas, ao sair da cadeia, converteu-se ao islã. Seguidor do islamismo há 30 anos, o tio Ananias o levou à mesquita da 912 Norte. “Ele estudava muito, fazia as orações. Fez muitos amigos”, conta Ananias. Um desses amigos, de 16 anos, apresentou Isac ao EI. “Eles ficavam vendo vídeos disso (EI), que não tem nada a ver com a religião”, ressalta.

O tio diz ter feito de tudo para convencer o sobrinho de que aquilo era errado. “Falei que o Estado Islâmico é formado por mercenários, financiado por países interessados em desestabilizar o Oriente Médio. Mas Isac sempre foi rebelde. Muito provavelmente por causa da ausência do pai”, comenta Ananias, dono de uma pequena empresa de dedetização, com loja na Asa Norte. “Isac trabalhou aqui. Mas, depois de preso, só vinha para ver clipes de rap na internet. Músicas que falam de violência”, conta o tio.

Ananias não tem dinheiro para pagar um advogado para o sobrinho. Nem a mãe de Isac, que, aos 52 anos, ganha R$ 1,1 mil mensais, fruto de uma aposentadoria engordada pelo bico como diarista em uma loja. Ela recebe o benefício desde que teve câncer de colo do útero, em 1999. Cria uma neta de 7 anos, com quem mora em um barracão, que divide um lote com outros três.

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